Mo-ho chih-kuan (jap. Makashikan 摩訶止観) é um dos três maiores trabalhos deixados por T'ien-t'ai Chih-i (China, século VI). É um texto extremamente importante para praticamente todas as escolas budistas chinesas e japonesas. Apresenta uma síntese do pensamento filosófico budista e das práticas que guiam até a iluminação.
Estou traduzindo aos poucos, é um texto denso e complicado, com jogos de palavras e uma quantidade enorme de notas e referências (absolutamente necessárias para compreensão do texto, não esqueça que ele tem 1500 anos...). Eu provavelmente ainda encontrarei erros no texto, quando isso acontecer, prometo atualizar o post. Além disso, ainda vou incluir os termos originais em chinês clássico para quem quiser se aprofundar na pesquisa (você vai encontrar diversas interrogações espalhadas pelo corpo do texto, é onde estariam os termos em chinês). Não fiz isso ainda por dar muito trabalho reescrevê-los no computador, assim perco muito tempo com detalhes ao invés de seguir com a tradução.
Espero que isso ajude a acabar com a ideia de que esses textos são inacessíveis e a popularizar o conhecimento. Segue a primeira parte, aproveitem. Boa leitura.
A
Grande Cessação e Contemplação
Mo-ho
chih-kuan
摩訶止観
Traduzido para o português pelo discipulo Renji 蓮耳 da versão em língua inglesa de Paul Swanson.
Ensinado
pelo grande mestre T'ien-t'ai Chih-che ?????? [Chih-i ??][1]
dos Sui.
Registrado
por Kuan-ting ??,[2]
um discípulo.
INTRODUÇÃO
(1a7-3b10)[3]
- A
Linhagem do Ensino [1a7-c1]
A
luminosa quietude da cessação e contemplação era desconhecida em eras
anteriores.[4]
O sábio [Chih-i] a esclareceu durante o [retiro de] verão do vigésimo sexto dia
do quarto mês de K'ai-huang 14 (594 EC) da dinastia do Grande Sui ao Yü-ch'üan
ssu 玉泉寺 em Ching-chou ??,[5]
aspergindo[6]
sua compaixão duas vezes ao dia.[7]
Embora sua eloquência ?? fosse sem impedimentos,[8]
ele completou apenas [até a seção sobre a contemplação] dos objetos de visões
[errôneas].[9]
Então a Roda do Dharma cessou de girar e ele não expôs as últimas seções.[10]
Ainda
como nos traços da água de um riacho alguém procura a fonte e sentindo uma
fragrância, alguém encontra sua origem.[11]
O Ta chih tu lun diz, “Eu [o Buda]
pratiquei sem professor.”[12] Um outro sutra diz, “Eu [Shakyamuni] recebi a
profecia [de atingir a Budeidade sem um mestre] de Dipamkara.[13]
Os Analectos dizem, “Aquele que é
nascido com conhecimento é superior; aquele que o adquire através do estudo é o
segundo melhor.”[14]
Os ensinamentos budistas são vastos e sublimes; eles brilham espontaneamente
com a verdade dos Céus, [e a compreensão de Chih-i sobre esse assunto é] como o
azul de uma planta índigo.[15]
Se
um praticante ouve [a transmissão] de um tesouro do Dharma ???, tal pessoa
conhece a essência de sua origem ??.[16]
[Sakyamuni], o Honrado do Mundo, que experienciou o grande despertar ??,
completou suas práticas religiosas através de incontáveis eons [em vidas
prévias, recebeu a profecia de sua futura Budeidade e nasceu como ser humano
neste mundo]. Então em seis anos [de disciplina ascética em sua vida como
Sakyamuni] ele ultrapassou as visões (drsti)
[errôneas] e derrotou Mara[17]
erguendo um único dedo [enquanto meditava sob a árvore Bodhi, atingindo seu
grande despertar].[18]
[Ele pregou o Buda Dharma] primeiro no Parque dos Cervos,[19]
e depois no Pico do Abutre,[20]
e finalmente no Bosque do Grou[21]
[próximo de Sravasti, onde ele faleceu]. Ele transmitiu o Dharma a
Mahakashyapa.[22]
1.
Mahakashyapa ???[23]
dividiu e distribuiu os restos mortais[24]
[do Buda] em oito porções,[25]
compilou o Tripitaka[26]
e transmitiu o Dharma para Ananda.[27]
2.
Ananda ??[28]
entrou no Samadhi do Vento ???[29]
enquanto estava no meio do Rio [Ganges] e dividiu seu corpo em quatro partes,[30]
e transmitiu o Dharma para Shanavasa.[31]
3.
Sanavasa ????[32]
fez a ambrosia [do Dharma] chover de suas mãos e manifestou os quinhentos
ensinamentos do Dharma[33]
e transmitiu o Dharma para Upagupta.[34]
4.
Upagupta [??]??[35]
atingiu o terceiro fruto [da não-retrogressão] quando ainda era um leigo e
atingiu o quarto fruto [do arhat] quando recebeu os preceitos,[36]
e transmitiu o Dharma para Dhrtaka.[37]
5.
Dhrtaka ???[38]
[já] tinha atingido o primeiro fruto [da entrada na corrente] quando ascendeu à
plataforma de ordenação e se tornou um arhat por completar a cerimônia de
ordenação.[39]
Ele transmitiu o Dharma para Miccaka.
6.
Miccaka ??? transmitiu o Dharma para
Buddhanandi.[40]
7.
Buddhanandi ???? transmitiu o Dharma para
Buddhamitra.[41]
8.
Buddhamitra ???? conferiu o tríplice
refúgio ?? [no Buda, Dharma e Sangha] a um rei depois de derrotar um numerólogo
[num debate][42]
e transmitiu o Dharma ao bhiksu Parsva.[43]
9.
O bhiksu [Parsva] ??? emergiu do útero com
seus cabelos já brancos.[44]
Luz emergiu de sua palma e ele tomou um sutra.[45]
Ele transmitiu o Dharma para Punyayashas.[46]
10.
Puyayasas ??? debateu e venceu Asvaghosa
[através da exibição de poderes espirituais como luz que emergia de sua mão][47]
e raspou sua cabeça tornando-se um discípulo.
11.
Asvaghosa ??[48]
compôs uma peça chamada Rastrapala ???? cuja musicalidade expressa [as verdades
de] transitoriedade, sofrimento e vazio, assim aqueles que a ouviam eram
despertados para o caminho [budista].[49]
Ele transmitiu o Dharma para Kapimala.[50]
12.
Kapimala ?? escreveu um tratado sobre a
ausência de eu (anatman) e onde esse
tratado era disseminado, visões falsas eram extintas.[51]
O Dharma foi transmitido para Nagarjuna.[52]
13.
[Assim para Nagarjuna ??,][53]
“arjuna” se refere à árvore sob a qual seu corpo físico nasceu e “Naga” se
refere [à criatura que, de acordo com a lenda, guiou Nagarjuna ao palácio das
profundezas do mar e o presenteou com as escrituras budistas que guiaram ao]
atingimento do corpo do Dharma.[54]
O Dharma foi transmitido para Deva.[55]
14.
[Kana]deva [??]??[56]
arrancou o olho divino [de uma estátua de Maheshvara] e então [no lugar]
ofereceu [seu próprio olho de carne a uma encarnação de Maheshvara e outro
nascia no lugar até ele oferecer] dez mil olhos de carne.[57]
O Dharma foi transmitido para Rahula[ta].[58]
15.
Rahula[ta] ???[59]
compreendeu [o conteúdo do] Livro dos
Nomes dos Demônios ??? e então derrotou os [Brâmanes][60]
não-budistas, transmitindo o Dharma para Sanghanandhi.[61]
16.
Sanghanandhi ???? ensinou um verso para
testar um arhat[62]
e transmitiu o Dharma para Sangayasata.[63]
17.
Sangayasata ???? estava em suas voltas
diárias pelo mar quando viu um palácio e lá ele ensinou um verso;[64]
o Dharma foi transmitido para Kumarata.[65]
18.
Kumarata ???? [tinha uma memória tão
maravilhosa que quando ele] viu dez mil cavaleiros ele poderia lembrar a cor de
[cada] cavalo, o nome de [cada] cavaleiro e [poderia até] diferenciar suas
vestes.[66]
O Dharma foi [então] transmitido para Jayata.[67]
19.
Jayata ??? fez um poço de fogo para [um
monge] que havia cometido sérias transgressões e o fez entrar [no poço] como
penitência; o poço tornou-se uma fonte e suas faltas foram extintas.[68]
20.
O Dharma foi transmitido para [Vasu]bandhu
??[69]
e então o Dharma foi transmitido para Manorhita.[70]
21.
Manorhita ??? divitiu [a terra] em duas
partes, [norte e sul] no Rio Ganges e ele mesmo ensinou que eram uma única
parte.[71]
22.
O Dharma foi então transmitido para
Haklenayasas ????[72]
e então para Simha.[73]
23.
Simha ?? foi posto à espada por [ordem do
terrível] rei de Damila[74]
e quando a espada cortou [fora sua cabeça] jorrou leite [ao invés de sangue].[75]
Então
o tesouro do Dharma foi transmitido, primeiro para Mahakasyapa e finalmente a
Simha, num total de 23 pessoas. *Madhyantika ???[76]
e Sanavasa [receberam a transmissão] simultaneamente, então, na verdade seriam
24 pessoas.
Tais
mestres foram [herdeiros] das profecias da Boca Dourada ?? [do Buda];[77]
eles eram pessoas nobres, capazes de beneficiar a muitos.
No
passado havia um rei que decidiu não construir um estábulo próximo a um templo,
mas preferiu construir perto de um matadouro [assim os animais que habitariam
lá seriam influenciados de acordo].[78]
Quanto mais serão influenciados os seres humanos para o bem através do encontro
com nobres [influências] e como podemos não nos beneficiar [desse encontro]!
Novamente,
havia um Brâmane que vendia caveiras, em algumas delas, uma vara poderia ser
passada [completamente] pelos buracos, em outras apenas até a metade e em
outras nem ao menos um pouco. [Alguém] construiu uma stupa e realizou serviços
memoriais em favor daqueles que cuja vara atravessava e como resultado [o
construtor] atingiu o renascimento no paraíso.[79]
A essência de se ouvir o Dharma pode ser comparada a essa virtude;[80]
o Buda tem transmitido o tesouro do Dharma pelo bem de tal benefício.
[1b13]
Neste [tratado da] cessação e contemplação, T’ien-t’ai Chih-che [Chih-i]
explica as abordagens do Dharma ?? que ele praticou em seu próprio coração e
mente.[81]
Quando
Chih-i nasceu, luz preencheu a sala e pupilas duplas apareceram em seus olhos.[82]
Ele praticou as recitações e articulou os dhāraṇī
do Sutra do Lótus [e compreendeu o
vazio no Monte Ta-su sob a tutela de Hui-ssu].[83]
Então no lugar de seu mestre do Dharma [Hui-ssu] ele discursou sobre as letras
douradas do Prajnaparamita Sutra.[84]
As duas dinastias dos Ch’en ? (557-589) e os Sui ? (589-618) o honraram como
“mestre imperial”. Ele adentrou à quietude numa posição meditativa, tendo
atingido o [quinto e mais alto] estágio dos “cinco níveis [preliminares] ??”.[85]
Adiante,
o Sutra do Lótus diz, “A oferta dos
sete tesouros[86]
dada por cada pessoa nas quatro centenas de miríades de milhões (koti) de bilhões (nayuta) de países e magicamente transformando-os de forma que
atinjam os seis poderes paranormais[87]
não é igual à centésima milésima milionésima parte da apropriada alegria ??
experimentada por uma pessoa [que atua pelo bem dos outros] pela primeira vez.”[88]
Quão mais deve ser o atingir do quinto nível [dos cinco níveis preliminares
atingidos por Chih-i]! O Sutra do Lótus
também diz, “Essa [pessoa que prega o [Sutra
do Lótus] é um mensageiro do Tathagata, um servo do Tathagata que executa
os desígnios do Tathagata.”[89]
O Mahaparinirvana Sutra fala de “um
bodhisattva no quinto estágio.”[90]
[Então o nível atingido por Chih-i não era insignificante].
[1b22]
O mestre de Chih-i foi Nan-yüe ?? [Hui-ssu ??].[91]
Os atos meritórios das práticas de Nan-yüe são inconcebíveis. Ele não fez nada
além de recitar [sutras] por dez anos, praticou [a penitência][92]
do Vaipulya ?? por sete anos e o
[samadhi][93]
constantemente sentado ?? por três meses[94]
e em um momento atingiu a perfeita realização ??. Ele era completamente
conhecedor ?? e tinha um entendimento profundo ?? de ambos ensinos Hinayana e
Mahayana.
Nan-yüe
estudou com o mestre em meditação Hui-wen ??,[95]
que não tinha iguais[96]
na área do Rio Amarelo ? e do Rio Huai ? durante o reinado de Kao-tsu [550-559]
na dinastia Ch’i do norte. Seus ensinos não eram entendidos pelas pessoas de
seus dias, assim como [as pessoas que] pisam na terra e observam o céu, mas não
sabem a profundidade [da terra] nem a altura [do céu].[97]
Hui-wen confiou exclusivamente no Ta chih
tu lun para sua disciplina mental ??. Esse tratado foi ensinado por
Nagarjuna, o 13º na linha de transmissão do tesouro do Dharma [como explicado
acima]. Em seu Tratado sobre a
Contemplação dos Pensamentos Chih-i diz, “Eu confiei a mim mesmo ao mestre
Nagarjuna.”[98]
Então sabemos que Nagarjuna era o mais alto patriarca [e fundador da linhagem
T’ien-t’ai].
Um
cético pode dizer “[O método do] Tesouro
do Meio é para desobstruir, enquanto a cessação-e-contemplação é
construtiva.[99]
Como eles podem ser considerados iguais?” Contudo, deveria ser conhecido o fato
há cerca de 17 comentadores indianos [do Mulamadhyamaka-karika de Nagarjuna];
nós não podemos afirmar que apenas Ch’ing-un ??[100]
[que enfatiza o lado negativo dos ensinos de Nagarjuna] e rejeitar os outros
comentários. O [próprio] Tratado do Meio
diz,
Todas
as coisas vêm a surgir através de causas e condições,
|
?????
|
Eu
explico como vazio,
|
?????
[ou ?]
|
Novamente,
isso é uma designação convencional.
|
?????
|
Novamente,
esse é o sentido do Caminho do Meio.[101]
|
?????
|
[1]
Lit. “o grande mestre e sábio do [Monte] T’ien-t’ai”. Esse título honorífico
concedido a Chih-i pelo Príncipe Sui Yang Kuang, um poderoso patrono de Chih-i.
Hurvitz explica: “O Príncipe, mantendo a injunção das escrituras de que um
piedoso leigo não pode falhar em respeitar seus serviços ao claro, preparou uma
residência monástica para Chih-i, para a qual ele foi cordialmente convidado.
Chih-i veio de Lu-shan até a residência do Príncipe, onde no 23º dia do 11º mês
de 591, administrou os sila do
bodhisattva a ele, concedendo-o o nome religioso de Tsung-ch’ih. O Príncipe em
retorno, deu a Chih-i o título honorífico de Chih-che, que ele carregou pela
história desde esse dia” (Leon Hurvitz, Chih-i
(538-597): An Introduction to the Life and Ideas of a Chinese Buddhist Monk,
Mélanges Chinois et Bouddhiques XII. Bruxelles: Institut Belge des Hautes
Études Chinoises, 1980, p. 145 [daqui em diante denominado “Hurvitz, Chih-i”]).
[2]
Kuan-ting (561-632) foi um discípulo próximo de Chih-i que “merece mais crédito
do que qualquer outro indivíduo por registrar os fatos da vida de Chih-i, por
preservar suas memórias e uma porção de sua correspondência e por passar por
escrito e em forma literária o conteúdo de muitos sermões de seu mestre sobre
as escrituras budistas e doutrinas e práticas religiosas” (Hurvitz, Chih-i, p. 178), incluindo o Mo-ho chih-kuan, Fa-hua hsüan-i, e Fa-hua
wen-chü. De fato, na maior parte das vezes, é impossível distinguir quais
seções do Mo-ho chih-kuan podem ser
atribuídas com certeza a Chih-i e quais são interpretações ou edições de
Kuan-ting.
Kuan-ting é considerado o
segundo patriarca da tradição T’ien-t’ai depois do próprio Chih-i e foi
responsável por organizar e estabelecer a tradição depois da morte de Chih-i.
Para detalhes, veja Hurvitz,Chih-i,
pp. 177-82.
[3]
Tradicionalmente se acredita que Kuan-ting escreveu uma introdução que segue
até 3b10 e que os comentários introdutórios em 3b10-4a17 deveriam ser
atribuídos a Chih-i. Contudo, o próprio texto não possui uma indicação clara de
onde os comentários de Kuan-ting “terminam” e onde os de Chih-i “começam”.
[4]
????????. A famosa frase de abertura do Mo-ho
chih-kuan pode ser entendida de inúmeras maneiras. Stevenson traduz como
“Calma e contemplação como luminosidade e tranquilidade: [este ensino] ainda
não havia sido ouvido em gerações anteriores quando...” (Daniel B. Stevenson e Neal Donner, Calming and Contemplation: A Study and
Annotated Translation of the First Chapter of Chih-i’s Mo-ho chih-kuan,
Honolulu: University of Hawaii Pressm 1993, p.99 [daqui em diante “Stevenson, Mo-ho chih-kuan”]). Veja ainda Neal Arvid
Donner, “The Great Calming and Contemplation of Chih-i. Chapter One: The
Synopsis” (Ph.D. dissertation, The University of British Columbia, 1976 [daqui
em diante “Donner, Mo-ho chih-kuan”]).
A tradição Tendai japonesa
oferece oito possíveis pontuações ou leituras da frase. Adiante, na segunda
parte da frase (????), é mais comumente traduzida como “nunca ouvida em eras
anteriores”, indicando sentimento de maravilha por seu surgimento. É justo
dizer que o ensino da cessação-e-contemplação não foi literalmente “nunca
ouvido” antes; Eu penso que a intenção de Kuan-ting em dizer era “desconhecido”
no sentido de que Chih-i foi o primeiro a clarificar e completamente expor seu
significado e que um texto como o Mo-ho
chi-kuan ainda “não havia sido ouvido”. Assim, eu traduzi a frase como
“desconhecido em eras anteriores”.
Há ainda mais nuances que
estão inclusas na compacta sentença em chinês, por exemplo, deveriam as frases
“cessação-e-contemplação” e “luminosa quietude” ser entendidas como compostas
ou deveriam os elementos ser considerados separadamente? Em chinês, ambos são
possíveis. Em um nível e como Kuan-ting explica mais tarde em sua introdução,
“quietude” modifica “cessação” e “luminosidade” modifica “contemplação” e ainda
é aceitável que “luminosa quietude” modifique “cessação-e-contemplação” como um
todo.
Outro ponto crítico é a
tradução do termo chih-kuan ??.
Embora seja a tradução chinesa de samata-vipasyana,
eu escolhi seguir as nuances dos caracteres chineses e Chih-i os usa para
traduzir: “cessação-e-contemplação.”
Veja o capítulo II do Mo-ho chih-kuan (21b12-23c12) para a exposição do próprio Chih-i sobre o
significado de chih-kuan.
[5]
O “Monastério da Fonte de Jade,” fundado por Chih-i em 592 ou 593 como o I-yin
ssu ??? (templo do único som), em Chiang-ling, próximo do seu local de
nascimento.
[6]
Lit. “chovendo.” A ironia é que o retiro de verão – os três meses durante os
quais Chih-i expôs o Mo-ho chih-kuan
– foi estabelecido por Sakyamuni com o objetivo de evitar os efeitos da estação
chuvosa.
[7]
De manhã e no entardecer ou anoitecer.
[8]
O 4º dos 4 tipos de capacidades de pregar o Dharma, ou as “quatro eloquências
desobstruídas” (catus-pratisamvid)
[veja o Glossary]. Quando um bodhisattva ouve um Dharma superior, ele se
deleita e pratica em favor dos outros. Também, para um bodhisattva deleitar-se
pregando o Dharma. Ikeda Rosan (Shokai
Makashikan Gendaigoyaku-hen [Estudos detalhados do Mo-ho chih-kuan; Tradução para japonês contemporâneo], Tokyo: Daizo
Shuppan, 1996, p.13 [daqui em diante, “Ikeda, Gendaigoyaku-hen”) traduz como “embora tivesse muito mais para
dizer”, e Stevenson (Mo-ho chih-kuan,
p. 99) como “embora seu desejo de pregar desconhecesse limitações.”]
[9]
Mais precisamente, na 4ª parte da 7ª seção do 7º capítulo, há a explicação de
“contemplando os objetos das visões [errôneas] ???, que é o 7º dos 10 modos de
contemplação.
[10]
Veja o guia do conteúdo do Mo-ho
chih-kuan. Para um conteúdo detalhado veja Ikeda Rosan, Makashikan kenkyu josetsu (Prolegomenon
ao estudo do Mo-ho chih-kuan), Tokyo:
Daito Shuppansha, 1986, pp. 200-216 [daqui em diante “Ikeda, Kenkyu josetsu”]. O índice de Ikeda
inclui os números de página do cânone Taisho para o Mo-ho chih-kuan e passagens correspondentes no importante
comentário de Chan-jan ?? (o sexto patriarca T’ien-t’ai), o Chih-kuan fu-hsing ch’uan-jun chüeh
??????? [T #1912, 46.141-446]; mais referências ao “Chan-jan” se referem a este
comentário, no decorrer com o volume e número de pagina da edição do Bukkyo taikei ???? [de agora em diante
“BT”] do Makashikan, 5 vols., Tokyo:
Nakayama Shobo (reimpressão) 1978. Veja também a completa tradução de Ikeda
Rosan do Mo-ho chih-kuan para japonês
moderno (1996), sua edição em texto crítico (1996) e um volume de notas (1997).
Então o Mo-ho chih-kuan não inclui uma exposição
dos últimos três dos dez modos de contemplação (ou seja, cotemplando os objetos
da arrogância, os dois veículos e os bodhisattva) e os últimos três capítulos
(“Resultados e Recompensa,” “Sobre Gotejar os Ensinos” e “O Significado
Final”). O conteúdo desses “não
proferidos” capítulos, contudo, pode ser inferido de outras partes do Mo-ho chih-kuan.
[11]
Uma frase em chinês clássico que Ikeda (Kenkyuchushaku-hen,
p.224) traça uma ligação com um poema de Shih-ching
?? (O Livro das Odes). Kuan-ting
delineia a linhagem da tradição T’ien-t’ai enfatizando primeiro a experiência
direta de Chih-i e então delineando uma suposta linhagem na qual T’ien-t’ai
pode basear sua autoridade.
[12]
Ou, “Minha prática (conduta) não [necessita] do reconhecimento de um mestre.”
Em outras palavras, o próprio Buda é a “fonte”. A autoridade do Buda não está
no que ele aprendeu de um mestre, mas é suficiente em si mesma, e Kuan-ting
evoca a mesma autoridade básica para Chih-i. A frase é do Ta chih tu lun ????, T 25.65a1. O Ta chih tu lun é um extenso comentário sobre o Pancavimsati-sahasrika-prajña-paramita-sutra [o “Sutra da perfeição
da sabedoria em 25 mil linhas; T #223; daqui em diante chamado de Pañcavimsati Sutra] atribuído a
Nagarjuna, traduzido para o chinês por Kumarajiva no século V e citado
frequentemente por Chih-i. Uma larga porção desse texto foi traduzida para
francês por Étienne Lamotte, Le Traité de
la Grande Vertu de Sagesse (Mahaprajñaparamitasastra), Lovain: Bibliothèque
du Muséon, 1944-1980 [daqui em diante “Lamotte, Le Traité”] em cinco volumes.
Essa frase é parte de um
verso explicando as circunstâncias da frase “uma vez” na abertura do sutra.
Lamotte, Le Traité, p. 73 traduz:
Ma conduite
(carya) n’a pas de maître (acarya),
Ma résolution (chanda) est une et sans égale.
Observant une pratique unique, je suis devenu Buddha,
De moi-même (svatah)
j’ai pénétré le noble chemin (arya-marga).
[13]
Uma paráfrase da seção de abertura do Sutra
sobre o Auspicioso Surgimento e Origens do Príncipe [Siddhartha] ???????, T
#185, 3.472c-73a, uma coletânea de histórias e lendas sobre a vida (e vidas
prévias) de Sakyamuni.
Dipamkara (ou Dipankara) ??
(luz imutável) é um dos tradicionais 24 Budas que se é dito que apareceram
neste mundo antes de Sakyamuni. Dipamkara, crê-se que encontrou Sakyamuni em
uma vida prévia e profetizou seu iminente atingir do Estado de Buda. Dipamkara
também aparece no capítulo “A Duração da Vida do Tathagata” no Sutra do Lótus, T 9.42b29, onde
Sakyamuni fala de Dipamkara (aqui escrito ??) e sobre seu alcance do nirvana deste
eternas eras passadas. Veja Leon Hurvitz, trad., Escritura da Flor de Lótus do Fino Dharma, traduzido para o chinês por
Kumarajiva. Nova York: Columbia University Press, 1976. [daqui em diante
“Hurvitz, Sutra do Lótus”], p. 238.
Em suma, Kuan-ting está
dizendo que a autoridade de Chih-i é também baseada nos ensinos (especialmente
do Buda) e em mestres que o precederam, assim como em sua própria experiência
direta.
[14]
Da seção 9, Livro XVI dos Analectos.
Arthur Waley traduz: “Mestre K’ung disse, Mais altos são aqueles que nasceram
sábios. Em seguida vêm aqueles que se tornam sábios pelo aprendizado. Depois
deles vêm aqueles trabalham duro para adquirir o conhecimento. Finalmente, na
classe mais baixa estão aquelas pessoas comuns que pertencentes àquele grupo
dos que trabalham duro, contudo sem nunca conseguir aprender” (The Analects of Confucius, Vintage
Books, p. 206). James Legge traduz: “Confúcio diz, “Aqueles que nascem com a
posse do conhecimento são da mais alta classe de homens. Aqueles que aprendem e
assim, prontamente tomam posse do conhecimento são os seguintes. Aqueles que
são todos e estúpidos e ainda assim conseguem aprender são a próxima classe
deles. Assim como aqueles que são todos e estúpidos e ainda assim não aprendem;
- eles são a mais baixa classe de pessoas’” (The Four Books, Paragon Books, 1996, pp. 247-48).
[15]
Ou, “brilham adiante solitariamente.” A frase “azul como a planta índigo” é de Hsün-tzu, usada para ilustrar a ideia de
que um discípulo ultrapassa seu mestre, pois algo que é tingido de azul com o
extrado da planta índigo é mais azul do que o material da própria planta. Burton
Watson (Hsün Tzu: Basic Writings,
Columbia University Press, p. 15 [daqui em diante “Watson, Hsün Tzu”]) traduz a abertura do Hsün Tzu:
O cavalheiro diz: Aprender nunca deve cessar. O azul vem da planta índigo, mas é mais azul
do que a própria planta. O gelo é feito de água, mas é mais frio do que a
água jamais será... Se o cavalheiro estuda largamente e a cada dia se examina,
sua sabedoria se tornará límpida e sua conduta será sem faltas. Se você não
escalar a alta montanha, você não compreenderá a altura dos céus; se você não
ouvir as palavras deixadas pelos antigos reis, você não entenderá a
grandiosidade de aprender.
Kuan-ting está louvando
Chih-i por seu conhecimento superior que ultrapassa seus predecessores e que
está baseado no próprio Dharma do Buda. Kuan-ting segue dando a linhagem do
Dharma de Chih-i, mas primeiro estabelece a autoridade de Chih-i diretamente
nas bases do próprio Dharma do Buda e sua experiência direta dele.
Chan-jan (BT-I, p. 31), por
outro lado, afirma que essa frase meramente indica que Chih-i está “encharcado”
ou “tingido” de grande aprendizado e que o uso dessa frase não tem intenção de
indicar que o aprendizado de Chih-i era maior do que de seus mestres.
[16]
Ou, “se ele ouve a linhagem registrada no A
Transmissão do Tesouro do Dharma, ele pode conhecer a origem de sua
escola.” A frase “transmissão do tesouro do Dharma” pode se referir à própria
ideia de transmissão, mas também aos três caracteres chineses no nome do texto
que é usado nessa seção para prover a informação biográfica e lendária sobre as
pessoas da linhagem T’ien-t’ai, ou seja, A
História da Transmissão do Tesouro do Dharma (T #2058, 50.297-322 [daqui em
diante A Transmissão]). A lista dos
23 (ou 24) mestres indianos ou da Ásia Central desse texto se tornaram a
“linhagem patriarcal da Boca Dourada” oficial para a tradição T’ien-t’ai e
também foram incorporadas mais tarde dentro das linhagens básicas Ch’an. Para
uma comparação da lista de nomes em A
Transmissão com suas sensíveis diferenças no Mo-ho chih-kuan, assim como as linhagens tardias Ch’an, veja o
encarte nos fundos do trabalho de Yanagida Seizan, Shoki zenshu shisho no kenkyu (Estudos dos textos históricos da
tradição Ch’an primitiva), Kyoto: Hozokan, 1967. Veja também a lista em Philip Yampolsky, The Platform Sutra of the Sixth Patriarch,
Nova York: Columbia University Press, 1967, pp. 8-9.
[17]
Ou, “forças demoníacas”. Mara é a personificação das paixões malignas e na
lenda da vida do Buda aparece tentando Siddhartha sob a árvore Bodhi na
tentativa de impedi-lo de atingir a iluminação. Coincidentemente, parece que a
sílaba ma aparece em sânscrito,
chinês e japonês como cognata do persa mogh,
do grego mageia, do latim magicus e do inglês “magic”.
[18]
Veja, por exemplo, o relato no Sutra do
Auspicioso Surgimento e Origens do Príncipe Siddharta, T 3.477a21-b5,
exceto por ao invés de “erguer um único dedo” a história segue dizendo que ele
“estendeu sua mão e tocou a terra” ou “apontou para a terra” para evocar sua
testemunha de derrotar Mara, uma postura depois reproduzida na iconografia
budista. Para um relato
tradicional dessa cena, veja E. J. Thomas, The
Life of Buddha as Legend and History, London: Routledge & Kegan Paul,
(reimpressão) 1975, p.74.
[19]
Em Benares (Varanasi), o local do primeiro sermão que Sakyamuni pregou depois
de atingir seu grande despertar, onde ele pregou o sermão das Quatro Nobres
Verdades e o Caminho Óctuplo. Veja, por exemplo, Étienne Lamotte e seu History of Indian Buddhism, Louvain:
Peeters Press, 1988, p. 17 [daqui em diante “Lamotte, History”].
[20]
Próximo de Rajagrha, onde a tradição afirma que Sakyamuni pregou, dentre outras
coisas, o Sutra do Lótus.
[21]
O Bosque Sala, onde Sakyamuni deu seus ensinamentos finais. Para Chih-i isso
significa o Mahaparinirvana Sutra, T
#375, 12.605-852, uma versão Mahayana do último sermão de Sakyamuni.
[22]
Para a romanização dos nomes próprios eu segui a lista contida em Yampolsky, The Platform Sutra of the Sixth Patriarch,
Columbia University Press, 1967, p. 8.
[23]
Um dos mais importantes discípulos diretos de Sakyamuni, um dos “dez maiores
discípulos,” conhecido por ser “avançado em poderes sobrenaturais” ou “avançado
em mendicância.” Para detalhes, veja Lamotte, History, pp. 18-23.
[24]
??, a transliteração chinesa de sarira,
as relíquias do Buda, as cinzas e ossos que restaram após sua cremação.
[25]
Veja o Agama Longo, T 1.30a4, que diz
que as sarira do Buda foram dividias
em oito partes iguais.
[26]
Durante o primeiro conselho em Rajagrha. Para detalhes, veja Lamotte, History, pp. 124-26. The Transmission (300a9-b10) diz como
Mahakasyapa primeiro pediu a ananda para recitar os dizeres do Buda (os
Sutras), então pediu a Upali para explicar os preceitos (o Vinaya) e então
compila-los ele mesmo em tratados (o Abhidharma) (300b5-6).
[27]
Veja The Transmission, 301a20; a
seção sobre Ananda continua em 301a2-304c.
[28]
Um dos dez maiores discípulos de Sakyamuni, conhecido como “avançado em ouvir.”
Ele serviu Sakyamuni por mais de 20 anos com sua constante e amável companhia e
era conhecido por usa memória infalível (razão pela qual ele foi requisitado
para recitar os ditos do Buda na ocasião do primeiro concílio em Rajagrha).
Para detalhes, veja Lamotte, History,
p. 19.
[29]
Abreviação de “Samadhi da Velocidade do Vento” ?????, um estado de concentração
no qual alguém pode fazer surgir um grande vento e partir seu próprio corpo em
pedaços.
[30]
Veja A Transmissão, 303b6-9:
“[Ananda] entrou no Samadhi Velocidade-do-Vento e dividiu seu corpo em quatro
partes: um aparte para Sakra Devendra, uma parte para o rei-dragão Sagara, uma
parte para os Licchavis de Vaisali, uma parte para o Rei Ajatasaru. Uma stupa
enfeitada com joias foi erguida em cada um desses lugares.” Para um relato mais
detalhado veja Lamotte, History,
pp.207-208.
[31]
Veja A Transmissão, 304c18.
[32]
Um discípulo de Ananda e fundador do monastério Natabhata no Monte Urumunda;
histórias a cerca de Sanavasa estão contidas no A Transmissão, 303b-305c. Para detalhes sobre as histórias de Buda,
Mahakasyapa, Ananda, Sanavasa e Upagupta como primeiros patriarcas e “cinco
mestres da Lei,” veja Lamotte, History,
pp. 207-12.
[33]
Ou, “estendeu suas mãos [no ar] e causou a chuva da ambrosia.” Veja A Transmissão, 304b9-10 e 22-28:
Upagupta teve quinhentos discípulos que ainda não
haviam atingido a liberação e cujas mentes eram ainda arrogantes e soberbos...
Sanavasa sabia que tais discípulos eram arrogantes. Ele ergueu suas mãos ao céu
e então fluiu leite aromático, como o jato de uma fonte do pico de uma alta montanha.
Ele perguntou a Upagupta, “Que sinal de concentração é este?” Upagupa entrou em
samadhi, mas ele não foi capaz de responder, nem mesmo de seu estado de
profunda contemplação. Então ele perguntou a seu mestre, “Que samadhi é esse?”
Sanavasa respondeu, “Esse é o chamado Samadi Velocidade-do-Dragão” e
[manifestou] quinhentos samadhis dessa maneira [presumivelmente pelos seus
quinhentos discípulos arrogantes]. Ele [Upagupta] perguntou, “Quais são os
nomes desses samadhis, pois os desconheço.” Sanavasa então os explicou um por
um.
Veja também A Transmissão, 313c9-10, onde a linhagem
de Mahakasyapa é brevemente reiterada e é dito de Sanavasa que teve
“continuamente girado a roda do Dharma, aspergindo adiante o sabor da ambrosia
para curar a sede das aflições das paixões.”
[34]
Veja A Transmissão, 313b6.
[35]
O discípulo de Sanavasa, profetizado pelo Buda de que seria aquele que
“trabalharia como um Buda” e de quem é dito que foi o mestre do Rei Asoka.
Histórias sobre Upagupa são encontradas numa seção extensa de A Transmissão, 304b-313b.
[36]
O caminho de se tornar um arhat consiste em atingir os “quatro frutos” (??, catvari-phalani): a entrada na corrente
(aquele que acaba de adentrar ao caminho), o ultimo retorno (aquele que só terá
mais um renascimento), o não-retorno (aquele que não terá mais renascimentos) e
o arhat. Lamotte, History (p.209)
explica: “Upagupta ... começa como um vendedor de perfumes. Sanavasa o ensina
como purificar seus pensamentos através de perceber os maus pensamentos como
seixos negros e os bons como brancos. Seu ascetismo mental habilita Upagupta a
resistir às investidas da amável cortesã Vasavadatta e a convertê-la quando o
infortúnio cai sobre ela. Upagupta finalmente obtém permissão de seu pai para
adentrar à vida religiosa. Ele é ordenado por Sanavasa no monastério Natabhata,
se torna um arhat e como consta, empreende o trabalho de um Buda.” Veja também
em A Transmissão, 305c-306a.
[37]
Veja A Transmissão, 313c15-23, onde
uma breve reiteração da linhagem desconsidera Upagupta e tem Sanavasa
transmitindo o Dharma diretamente para Dhrtaka. Lamotte, History, pp. 209-210, relata que a relação dos “cinco mestres da
Lei” (que termina com Upagupta) diz que “Sanavasa então transmitiu a Lei
[Dharma] para Upagupta, advertindo-o para confiá-lo por sua vez ao jovem
Mathuran, Dhitika.”
[38]
O Mo-ho chih-kuan tem os últimos dois
caracteres trocados: ???.
[39]
Lit. o “karma triplo” ???. Uma interpretação tripla de um artigo explicando o
propósito de alguém, mesmo numa cerimônia de ordenação ou numa cerimônia de confissão.
Veja o Vinaya em Quatro Partes ???, T
22.99a18-19. A Transmissão, 313c2
contém a frase “controladas e removidas as aflições das paixões deste mundo
tríplice enquanto executando o ‘karma triplo,’ estabelecidas as nobres práticas
e tornado um arhat,” mas não está bem claro se esse texto está se referindo a
Dhrtaka.
[40]
Veja A Transmissão, 313c25-27: “No
passado, quando Dhrtaka estava prestes a adentrar à extinção, ele transmitiu o
Dharma para seu maior discípulo Miccaka, que tinha ouvido muito, tinha
alcançado amplos atingimentos e tinha o talento de grande eloquência.”
[41]
Veja o A Transmissão, 314a2-4. O
único comentário sobre esse personagem é que ele “guiou o sabor superior da
ambrosia [do Dharma] de forma a ser largamente propagado. Ele mais tarde disseminou,
discriminou e girou a roda do grande Dharma, subjugando as forças iradas de
Mara. A Transmissão usa o caractere ?
ao invés de ? para os nomes deste e do próximo personagem.
[42]
Veja a história em A Transmissão,
314a5-b2, que conclui, “Então o rei soube que havia sido testado, então ele se
converteu de seus pensamentos errôneos, respeitou e acreditou no Dharma
correto, aceitou o triplo refúgio e tornou-se um discípulo do Buddha”
(314a29-b1).
[43]
Veja A Transmissão, 314b28-29.
[44]
Veja A Transmissão, 314c1-2, onde diz
que “Parsva, devido a carmas passados, permaneceu no útero de sua mãe por mais
de sessenta anos e quando ele finalmente nasceu, seus cabelos e barbas já eram
brancos.” Chan-jan (BT-I, p. 46) adiciona que “ele fez um voto de nunca
repousar.”
[45]
Essa frase está inclusa no A Transmissão
sobre a vida do patriarca seguinte, Punyayasas; veja 315a5-7: “No momento em
que o nobre [Punyayasas], usando poderes sobrenaturais esticou sua mão direita
para alcançar o interior da sala. Luz emanou de seus cinco dedos e através
dessa iluminação tudo na sala foi manifestado. Naquele momento as ilusões da
mente cheia de dúvidas de Asvaghosa foram erradicadas.” De acordo com o
conteúdo de A Transmissão, além
disso, a frase (e conversão de Asvaghosa) deveriam ser atribuídas a Punyayasas.
Por outro lado, a tradição budista considera que Asvaghosa era pupilo de
Parsva, um mestre Vaibhasika (veja Lamotte, History,
p. 522).
[46]
Veja A Transmissão, 314c9.
[47]
Veja nota 45 acima.
[48]
Um famoso poeta budista que viveu no século II EC e autor de Buddhacarita, uma biografia do Buda
(veja E.H. Johnston, The Buddhacarita:
or, Acts of the Buddha, 2 vols., Delhi: Motilal Banarsidass, 1936). O Despertar da Fé ????? (T #1666 e 1667,
T 32.575-590) é popularmente, embora pareça que erroneamente, atribuído a ele
(veja Hakeda Yoshito, The Awakening of
Faith: Attributed to Asvaghosha, Nova York: Columbia University Press,
1967). Detalhes sobre Asvaghosa são dados em A Transmissão, 314c-317a.
[49]
Veja A Transmissão, 315a19-b2:
Desejando salvar os seres sencientes na cidade,
[Asvaghosa] compôs uma sublime peça de música chamada Rastrapala, cujo som era puro e elegante, com um tom gracioso e que falava dos ensinamentos do sofrimento,
vazio e ausência de eu, assim todas as coisas condicionadas são como uma
ilusão e um truque mágico; o mundo tríplice é como estar amarrado numa prisão
sem um único prazer sequer. [Ela ensinava assim,] que embora o nível de um rei
seja alto, com o poder de agir como desejar, ele é transitório e quem pode
mantê-lo? Ele é como as nuvens no céu, que certamente se dissiparão e
desaparecerão. Este corpo [físico] é vazio e oco como o caule da bananeira;
isso deveria ser temido como bandidos e ninguém deveria se tornar íntimo dele.
É como ter uma serpente venenosa na sua bolsa; quem poderia achar isso atrativo
e prazeroso? Assim os Budas sempre repreendem o [corpo] físico e largamente
ensinam o significado do vazio e da ausência de eu.
Então, chegou o momento em que essa peça deveria ser
tocada. Naquele momento, os músicos não estavam aptos para compreender [o
significado da peça], assim a afinação dos instrumentos e os sons da música
foram confusos. Então Asvaghosa, usando vestes brancas, entrou no meio dos
músicos, bateu o tambor ele mesmo e afinou as cordas das harpas, assim a música
tornou-se elegante e seu timbre perfeito. A apresentação comunicou as verdades
do sofrimento, vazio e ausência de eu. Então
os quinhentos príncipes na cidade simultaneamente atingiram o despertar,
tornaram-se avessos ao mal dos desejos dos cinco [sentidos] e deixaram o lar
adentrando ao caminho [do Budismo].
[50]
Veja A Transmissão, 317a29.
[51]
Veja A Transmissão, 317a29-b6. É dito
que Kapimala era “eloquente na fala e profundo em sua sabedoria. Não havia
erros nas teorias não-budistas que não pudesse derrotar. Ele era ativo no sul
da Índia e escreveu um tratado sobre a ausência de eu em cem versos. Não havia
nada que não tivesse sido abordado entre os tópicos cobertos pelo tratado,
assim como o relâmpago-vajra destrói tudo em seu caminho.”
[52]
Veja A Transmissão, 317b6-7.
[53]
O famoso e influente fundador da escola Madhyamika, provavelmente do século II
EC. Autor de Tratado do Meio ??, a
fonte (verso 24:18) de inspiração da formulação da verdade tríplice de Chih-i.
Para um estudo detalhado da relação entre o pensamento de Nagarjuna e o de
Chih-i, veja Ng Yu-Kwan, T’ien-t’ai
Buddhism and Early Madhyamika, Honolulu: University of Hawaii Press, 1993.
[54]
A Transmissão (317b111-12) diz,
“[Nagarjuna] nasceu sob uma árvore ?, e atingiu o caminho através de um dragão-naga ?; assim ele tem o nome de
‘Nagarjuna’.” Detalhes adicionais sobre Nagarjuna são dados em A Transmissão, 317b6-318c15; para
detalhes sobre a vida e obra de Nagarjuna veja Max Walleser, “The Life of
Nagarjuna from Tibetan and Chinese Sources,” Asia Major, Hirth Anniversary volume, 1922, pp. 421-55; Lamotte, La Traité, pp. vii-xviii; e Richard
Robinson, Early Madhyamika in India and
China, Delhi: Motilal Banarsidas (reimpresso 1976), pp. 21-27 [daqui em
diante “Robinson, Madhyamika].
[55]
Melhor conhecido como “Aryadeva.” Veja A
Transmissão, 318c18, onde consta o nome completo de “Kanadeva” ????.
Aryadeva é também conhecido como “Kanadeva” (Deva “de um olho”), pois
acredita-se que era cedo de um olho. Veja as notas que seguem.
[56]
Aryadeva (170-270?), o mais famoso dos discípulos de Nagarjuna. Ele
agressivamente defendia o sistema Madhyamika através de debate e numerosos
escritos, incluindo o polêmico Tratado em
uma Centena de Versos ?? (T #1569, 30.168-181), um dos três textos básicos
da escola San-lun.
[57]
A versão extremamente abreviada no Mo-ho
chih-kuan consta apenas que “arrancou o olho divino e ofereceu cem mil
olhos de carne.” Minha expansão é baseada nos comentários e interpretação de
Chan-jan (BT-I, pp. 49-50). Há uma longa exposição sobre Aryadeva no A Transmissão, 318c18-319c14, que parece
de alguma forma diferente:
O nome “Kanadeva” [se baseia na ocasião quando] ... o
grande deus Mahesvara disse “... Você fez oferendas de comidas que são
deliciosas. Agora você deve ofertar seu olho esquerdo. Se você estiver apto a
ver, então essa será a maior e suprema das oferendas.” Deva replicou, “Bom. Eu
aceito sua instrução.” Então ele tirou fora e ofereceu seu olho esquerdo, mas
possuindo poderes espirituais divinos, outro [olho] apareceu no lugar. Isso
continuou até que muitas dezenas de milhares de olhos apareceram. Mahesvara o
louvou dizendo: “Essa oferenda está completa. Essa é verdadeiramente uma
oferenda suprema.” (319c18-29)
[58]
Ou, “Rahulabhadra”; veja A Transmissão,
319c14.
[59]
Um mestre na doutrina do vazio na escola Madhyamika. Veja A Transmissão, 319c14-29.
[60]
Veja A Transmissão, 319c20-29:
Houve um tempo em que havia um brâmane que era
inteligente, sábio, desperto e hábil em debates. Ele escreveu O Livro dos Nomes dos Demônios, que era
excessivamente difícil de entender. Seus capítulos eram vastos, com muitas
dezenas de centenas de versos. (...) Nagarjuna o entendeu completamente ouvindo
apenas uma vez e estava apto a memoriza-lo como se o tivesse recitado
extensivamente. O bodhisattva [Arya]deva não o havia compreendido, mas depois
de muitas explicações e de ouvi-lo repetidamente ele chegou ao claro
entendimento. [Arya]deva ensinou sobre tais capítulos com vasto discernimento
para Rahula[ta], que ouviu e entendeu imediatamente. Naquele momento, os
brâmanes ficaram grandemente surpresos com a erudição desses monges e disseram,
“Mesmo que lêssemos esse texto, levaria um longo tempo até estarmos aptos a
compreendê-lo. Vocês estavam aptos a compreendê-lo como se já tivessem
repetidamente o analisado.” Então os brâmanes desistiram de sua fé e foram
convertidos de suas convicções errôneas.
[61]
Veja A Transmissão, 319c29-320a1,
onde o nome é dado como ????.
[62]
Veja A Transmissão, 320a1-25: Naquele
tempo, havia um arhat que rejeitou os fardos da vida secular e foi dotado de
muitas qualidades virtuosas. Sanghanandhi quis testá-lo e então perguntou para
ele na forma de versos:
O que é
nascido da semente de um girador da roda (rei, cakravartin),
mas não
é nem um Buda, nem um arhat,
não
nasce em uma outra vida
e não é
um pratyekabuddha?
O arhat de grande virtude
era conhecido por sua grande intuição e entrou em samadhi, mas ainda assim não
foi apto a conseguir uma resposta. Ele então usou poderes paranormais para ir
até o Paraíso Tusita e perguntar a Maitreya sobre a resposta. A resposta era
“um pote de barro,” pois o pote de barro é formado através do oleiro “girar a
roda”, eventualmente se quebra e não renasce e não é um Buda, arhat ou
pratyekabuddha. O arhat retornou a Sanghanandhi e deu a resposta, assim Sanghanandhi
reconheceu que a resposta vinha de Maitreya. Depois da morte de Sanghanandhi,
esse arhat tornou-se Sangayasata.
[63]
Veja A Transmissão, 320a23-34.
[64]
Veja A Transmissão, 320a25-b4:
Sangayasata estava andando [na sua ronda de mendicância diária] ao longo da
costa do grande mar quando ele passou por um opulente palácio adornado com sete
joias e tanto mais. Quando teve essa visão, Sangayasata fez sua mendicância
enquanto dizia o seguinte verso – “Fome é a doença primária; volições [das
paixões] são a [fonte] primária do sofrimento. Aqueles que conhecem esse Dharma
podem atingir o caminho do nirvana.” Ouvindo isso, o mestre do palácio se
converteu ao Dharma budista.
[65]
Veja A Transmissão, 320c1.
[66]
Veja A Transmissão, 320c20-22:
“Kumarata, com um olhar [sobre os dez mil cavalos e cavaleiros], completamente
distinguiu todas as pessoas e seus nomes, cor de cada cavalo, suas roupas e
expressões faciais e assim o fez sem cometer sequer um único engano.”
[67]
Veja A Transmissão, 320c24-28.
[68]
Veja A Transmissão, 320c24-321b23:
Jayata possuía grandes qualidades meritórias. Ele era
diligente e corajoso, esforçava-se rigorosamente em cultivar as práticas
ascéticas. Ele manteve bem os preceitos de proibição, sem violar sequer um. Ele
foi o ultimo mestre no Vinaya profetizado pelo [próprio] Honrado do Mundo.
Agora, em meio a assembleia [budista] havia um certo
monge cuja esposa do irmão veio ao templo trazendo comida. O fogo do desejo
queimou dentro dele e eles se envolveram numa relação [sexual]. Depois de
cometer essa grave ofensa, o monge se arrependeu de seu feito e estava
extremamente envergonhado dizendo, “Eu sou um grande tolo e criei esse mau
carma. Eu não posso mais praticar o samadhi e ser um discípulo de Sakyamuni.”
Ele então retirou suas vestes monásticas e abandonou sua tigela de mendicância (...)
e perambulou de lugar em lugar anunciando em alta voz, “Eu sou um ofensor, que
não pode se recuperar e que denegriu as vestes do Dharma do Buda. Eu cometi um
erro tão grave que me fará certamente cair no inferno. Onde poderei obter ajuda
e proteção?” Então Jayata disse a esse monge, “Se você estiver apto a seguir
minhas instruções, então você poderá gerar causas para que [os efeitos cármicos
de] seus erros sejam extintos.” O monge se alegrou e disse que aceitaria seus
ensinos. Então Jayata, por meio de seus poderes sobrenaturais, criou um poço de fogo cujas chamas queimavam
com grande intensidade e orientou o monge para que se atirasse dentro, ao meio
[das chamas]. Como o monge atirou seu corpo dentro do poço de grandes
chamas de forma que suas faltas fossem extintas, as chamas intensas se tornaram
em um límpido correr de água pura e o monge não se feriu. Então Jayataka disse
ao monge, “Você se arrependeu de suas faltas com boas intenções, então [o
efeito cármico de] seus erros está agora extinto,” e como resultado de ouvir o
Dharma [o monge] tornou-se um arhat. (320c24-321a13)
[69]
Em A Transmissão consta ????.
Vasubandhu (320-400) é um dos mais importantes filósofos da tradição budista
indiana. A ele é atribuída a autoria do Abhiddharma-kosa-sastra
(T #1558, 29.1-159) depois que ele foi convertido ao Mahayana por seu irmão
Asanga e autor ao menos de dois dos tratados básicos da escola Yogacara, o Vimsatikavijnaptimatrata-siddhi (Vinte
versos) e Trimsikavijnaptimatrata-siddhi
(Trinta versos), assim como um comentário sobre o Sutra do Lótus (Tratado sobre
o Sutra do Lótus, T #1519). É curioso o fato de que para um personagem tão
importante na tradição budista, apenas as poucas linhas seguintes sejam
oferecidas no A Transmissão
(321b22-29):
Quanto o honorável Jayata estava prestes a adentrar à
extinção, ele disse a um monge chamado Vasubandhu, “Ouça cuidadosamente agora.
No passado havia um mestre de deuses que diligentemente cultivou as práticas
ascéticas por imensuráveis eons, pelo
bem do supremo e sublime Dharma. Agora ele está satisfeito e pode
beneficiar e trazer paz aos seres sencientes. Eu aceitei sua tradição e
sinceramente a mantive. Agora eu desejo passa-la para você, você deve refletir
profundamente sobre isso.” Vasubandhu disse, “Eu aceito seu ensino.” Naquele
momento ele propagou o tesouro dos sutras [budistas] com tamanha capacidade de
aprendizado, sabedoria e eloquência. Ele foi adornado com a qualidade meritória
de estar apto a compreender bem todos os significados dos sutras. Ele os ensinou
sem distinção e salvando largamente os seres sencientes.
[70]
Ou Manura; veja A Transmissão,
321b29.
[71]
Que é, na parte sul do Ganges. Veja A
Transmissão, 321b29-c11, especialmente 321c6-11:
Naquele tempo, esse
Manorhita estava no norte da Índia e o nome *Yasas disse para ele, “Ao sul do
Rio Ganges há uma segunda terra da Índia. Há muitas pessoas com visões
errôneas, mas que são eloquentes e inteligentes. Você, ó sábio, tem bom
entendimento e é bom ao debater. Você deveria ir até aquela terra e ensinar [o
Dharma do Buda]. Então Manorhita seguiu tais instruções e foi até a segunda
terra da Índia [ao sul do Ganges] e largamente propagou o ensino da ausência de
eu. Ele superou todas os ensinos heterodoxos e visões errôneas até o fim de sua
vida.
[72]
Veja A Transmissão, 321c11-14; nenhum
detalhe é dado sobre esse personagem.
[73]
Veja A Transmissão, 321c14.
[74]
Ou “Mihirakula.” Setevenson, Mo-ho
chih-kuan (p. 103) traz: “Sct. Dravida. De acordo com Hsüan-tsang era no
sul da Índia, 1,500-1,600 li ao sul
de Cola.” Veja também Neal A.
Donner e sua dissertação “The Great Calming and Contemplation of Chih-i:
Chapter One: The Synopsis,” Pd.D. dissertation, The University of British
Columbia, 1976, p. 62 (daqui em diante “Donner, Mo-ho chih-kuan”).
[75]
Veja A Transmissão, 321c18-19:
“quando a espada afiada decapitou Simha, não sangue, mas leite fluiu de sua
cabeça.”
[76]
Esse personagem não é mencionado acima, mas aparentemente era contemporâneo de
Sanavasa.
[77]
Então essa linhagem é tradicionalmente conhecida como linhagem “Boca Dourada.”
[78]
Veja A Transmissão, 322a6-19: Havia
um rei que usava um elefante branco para realizar suas execuções – através de
fazer o elefante pisotear os criminosos até a morte – pois o elefante havia
sempre um comportamento furioso. Houve um dia, contudo, quando o elefante se
tornou dócil e não cumpriu sua tarefa como esperado. O rei descobriu que o
elefante tinha estado próximo a um monastério onde se recitava as escrituras
budistas; a boa influência de ouvir a recitação dos sutras curou o
comportamento mau do elefante e o tornou compassivo. Então o rei transferiu o
elefante para um local próximo a um matadouro e as influências malignas e o
cheiro de sangue logo reavivaram o desejo sanguinário do elefante. Assim, o
texto segue, esse é o poder das boas e más influências do nosso meio.
[79]
A história completa está em A Transmissão,
322b7-22: Havia um brâmane que possuía muitas caveiras e estava tentando
vendê-las, mas sem sucesso. Ele começou a amaldiçoar as pessoas, ameaçando-as
com muitos infortúnios se eles não comprassem as caveiras. Um leigo da cidade
teve medo e comprou as caveiras. Ele testou as caveiras com um cajado de
bronze, dizendo que as caveiras que o cajado atravessasse completamente seriam
as mais valiosas, sem valor adicional para aquelas que o cajado não
atravessasse. Quando o brâmane perguntou qual a razão de tal avaliação, o leigo
disse que a “penetração” da caveira dependia do quanto aquela pessoa foi hábil
em ouvir e entender o maravilhoso Dharma do Buda; aqueles com conhecimento
“penetrante” tinham mentes que “vazias” daquela forma. O leigo comprou então as
caveiras que eram "penetrantes” e construiu uma stupa para elas.
[80]
Que é, aqueles que ouviram o Dharma do Buda e tornaram-se “vazios” em suas
mentes e dignos de adoração.
[81]
Daqui em diante o Mo-ho chih-kuan é
baseado na vasta experiência pessoal de Chih-i e sua prática do caminho budista e não é meramente um exercício
acadêmico. Para detalhes sobre a vida e prática de Chih-i, veja Hurvitz, Chih-i, esp. pp. 100-73; e Kyoko Jiko, Tendai Daishi no shogai [A vida de
Chih-i], Regulus Library 38, Tokyo: Daisan Bunmeisha, 1975, [daqui em diante
“Kyodo, Tendai Daishi”].
[82]
De acordo com o Livro de História, o
antigo rei-sábio Shun tinha pupilas duplas; então a aparição de pupilas duplas
é um sinal auspicioso sinalizando o nascimento de um potencial rei-sábio.
[83]
Essa é a prática descrita como “confissão do Lótus” e consta no Mo-ho
chih-kuan como parte do samadhi ambos-andando-e-sentado; veja Mo-ho chih-kuan 14a5-b11. Para um estudo
comparativo de Hui-ssu e Chih-i e a prática do Samadhi Lótus veja Ocho Enichi e
seus artigos “Nangaku Eshi no hokke-zanmai” e “Tendai Chigi no hokke-zanmai” em
Hokke shiso no Kenkyu (Estudos sobre
o pensamento Lótus), Kyoto:
Heiraku-ji Shoten, 1975, pp. 265-303.
[84]
Hurvitz, Chih-i, pp. 108-109, explica
tal estágio da vida de Chih-i como segue:
Enquanto no Monte Ta-su, Hui-ssu ensinou a Chih-i o ssu na lo hsing ????, ou seja, o método
que ele mesmo havia elaborado para compreensão através de métodos
contemplativos, o espírito do Lótus.
Chih-i dedicou-se com a maior diligência, submetendo-se completamente a uma
rigorosa maneira ascética de viver. Quando ele atingiu tal seção do Bhaisajyarajapurvayogaparivarta ???????
que descreve a auto-imolação do bodhisattva Sarvattvapriydarcana, seu “corpo e
mente estavam vazios e ele adentrou, em quietude, à contemplação. (...) Sua
compreensão do Lótus foi como uma
forte luz brilhando num vale escuro; seu atingir à natureza dos dharmas lembrou
um sopro extenso de vento atravessando um grande espaço vazio” [veja A Biografia de T’ien-t’ai Chih-che
?????????, T 50.191c27-28]. Tendo seu lampejo de percepção, ele correu para
informar seu mestre disso e mais tarde, considerando-o verdadeiramente
merecedor de ser guiado até as mais altas verdades, deu a ele o completo
benefício de sua instrução. Chih-i havia então, atingido ele mesmo a perfeição
em ambos aspectos intelectual e intuitivo do Budismo. Hui-ssu disse a ele que
nenhum filósofo calvo do mundo poderia superá-lo num debate agora. Quando ele
reproduziu o Prajñaparamita e o Lótus em letras de ouro, Hui-ssu ensinou
sobre eles novamente, então permitindo a Chih-i que ensinasse depois disso,
reservando apenas a ele a exposição de certos detalhes. Hui-ssu, que deveria
assistir a suas explicações, está registrado que disse, “Bem, digamos que
quando o Dharma foi dado em cargo do ministro do Dharma, o rei do Dharma não
tem nada a acrescentar.”
Para detalhes sobre Hui-ssu
veja abaixo; veja também Paul Magnin e La
vie et l’oeuve de Huisi (515-577): Les origines de la secte bouddique chinoise
du Tiantai. Paris: École Française d’Extrême-Orient, 1979.
[85]
Os “cinco níveis preliminares de um discípulo” são estágios relativamente
baixos de compreensão na estrutura de T’ien-t’ai no caminho ao Budado,
precedendo aos tradicionais quarenta e quatro ou cinquenta e dois estágios
embora haja poucos que atinjam até mesmo este nível. Eles se baseiam em uma
passagem do Sutra do Lótus (T
9.44c-46b) e consistem em (1) a alegria de ouvir o Dharma e perceber sua
verdade, (2) ler e recitar os sutras, (3) pregar o Dharma, (4) a prática
preliminar das seis perfeições (paramita)
e (5) a manutenção correta das seis perfeições. É dito que no leito de morte,
Chih-i declarou ter atingido apenas o quinto desses cinco estágios preliminares
e não havia avançado até os estágios do bodhisattva, pois ele tinha devotado
muito tempo treinando seus discípulos ao invés de se concentrar em seu próprio
desenvolvimento (veja Hurviz, Chih-i,
p. 172). Contudo, Kuan-ting segue em sua introdução para mostrar que esse não
era um nível de atingimento insignificante. Chan-jan (BT-I, p. 67), em resposta
a uma pergunta que questionava se esse não era um atingir “menor”, afirma que
de fato seu atingir foi de “meritória profundidade” ??.
[86]
??: ou “sete joias.” A lista varia de texto para texto, mas uma lista comum é:
ouro, prata, lápis lazuli, madrepérola, ágata, coral e âmbar. O Sutra do Lótus (T 9.21b20-21; Hurvitz,
p. 125) lista “ouro, prata, vaidurya, concha gigante, ágata, pérola e
coralina.”
[87]
??: seis poderes paranormais ou sobrenaturais possuídos por uma pessoa
iluminada: a habilidade de aparecer em qualquer lugar que quiser; a habilidade
de ver a vida futura própria e dos outros; a habilidade de ouvir sons que os
outros não podem; a habilidade de ler as mentes de outras pessoas; a habilidade
de perceber as vidas passadas próprias e dos outros; a habilidade de remover as
aflições das paixões de alguém. Para uma discussão detalhada veja Lamotte, Le Traité IV, pp. 1809-27.
[88]
Paráfrase da passagem do capítulo 18, “Os Méritos da Alegria Apropriada,” T
9.46c24-28; veja Hurvitz, Lotus Sutra,
p. 259:
O mérito recebido por esse homem por oferecer toda
sorte de coisas agradáveis aos seres vivos dos seis destinos nas quatro
centenas de miríades de milhões de asamkhyeyas de esferas de mundos e também
por permitir a eles que obtenham o fruto do arhant, não se iguala em um
centésimo, nem um milésimo, sequer um centésimo de milésimo de miríade da
milionésima parte do mérito da décima quinta pessoa que se regozija apropriadamente
ao ouvir um único gatha da Escritura da Flor do Dharma, pois isso é algo que
não pode ser conhecido através de números ou parábolas.
Isso ilustra a “alegria de
ouvir o Dharma”, o terceiro dos cinco níveis preliminares.
[89]
Do décimo capítulo sobre os “Pregadores do Dharma,” T 9.30c28. Hurvitz, Lotus Sutra, p. 175, traduz:
Se esse bom homem ou boa mulher, depois da minha
extinção, puder secretamente para uma única pessoa pregar ao menos uma única
frase da Escritura da Flor do Dharma, seja sabido que tal pessoa é um emissário do Tathagata, enviado pelo
Tathagata, fazendo o trabalho do Tathagata. Quanto mais pode ser dito
daquele que em meio a grande multitude largamente o prega para homens em geral!
Isso ilustra o “pregar o
Dharma,” o terceiro dos cinco níveis preliminares.
[90]
Lit., “o primeiro [nível] de bodhisattva [nos quais as pessoas] confiam.” Essa
frase propriamente não está no Mahaparinirvana
Sutra, mas refere-se à seção de abertura do capítulo sobre os “Quatro
Refúgios” (T 12.637a20-22), que descreve os quatro tipos de seres nos quais as
pessoas podem confiar e tomar refúgio: 1) aquele que ainda não extinguiu as
suas paixões mas já está apto a beneficiar os outros, 2) aqueles que adentraram
à corrente e os que só retornarão mais uma vez, 3) aos que não mais retornarão,
e 4) os arhats. No Fa-hua hsüan-i
(veja T 33.732b-741b) de Chih-i, tais níveis são identificados respectivamente
com 1) os cinco níveis preliminares de um discípulo e os estágios de pureza dos
seis sentidos, 2) os estágios das dez habitações, 3) os estágios dos dez níveis
de prática e dez níveis de transferência de méritos e 4) os dez estágios do
bodhisattva (bhumi) e o estágio de
equivalência com o estado de Buda. Chih-i disse que atingiu o primeiro nível,
que é, os cinco níveis preliminares de um discípulo.
[91]
Hui-ssu (515?-577), é considerado o segundo patriarca chinês da escola
T’ien-t’ai, era um mestre do Samadhi do Lótus e na filosofia do vazio prajñaparamita, ambos aspectos de
ensinamentos e prática budistas que foram incorporados por Chih-i como
características principais do sistema T’ien-t’ai. A Hui-ssu é atribuído uma das
primeiras aplicações do conceito de mo-fa
?? (mappo; “período do fim do
Dharma”). Trabalhos atribuídos a ele incluem o Estabelecimento dos Votos ?????????? (T #1933, 46.786-787), que
contêm referêcias ao conceito de mo-fa
e exposições de várias práticas como A
Prática de Atingimento da Paz baseada no Sutra do Lótus ??????? (T #1926,
46.697-701) e O Samadhi de Seguir os
Pensamentos Alheios ????? (Dai-Nihon
[Manji] zokuzokyo ???[卍]??? [daqui em diante “Zoku”]
98.687-707). Veja também notas acima.
Aqui começa a explicação de
uma “segunda” linhagem que começa com Hui-ssu, mas é traçada de volta até
Nagarjuna.
[92]
Uma espécie de prática de samadhi que envolve penitência e recitação de dhāraṇīs, baseado no Sutra do Grande Dhāraṇī Vaipulya (*Mahavaipulya-dhāraṇī-sutra ???????; T
#1339, 21.641-661); que foi incorporado por Chih-i dentro de seus Quatro
Samadhis como parte de “samadhi ambos-andando-e-sentado.” Para detalhes e a
exposição de Chih-i no Mo-ho chih-kuan,
veja a tradução e notas ao 13a24-14a5. Veja Daniel B. Stevenson e seu artigo “The Four Kinds of Samadhi in
Early T’ien-t’ai Buddhism” (1986), esp. pp. 61-67. Veja também meu
artigo “Dandala, Dhāraṇī e Denarii: A T’ien-t’ai
Perspective on the Great Vaipulya Dhāraṇī
Sutra” (1997).
[93]
Veja a explicação do próprio Chih-i sobre esse samadhi no Mo-ho chih-kuan, 11a28-12a19.
[94]
Lit., “nove períodos” ??: ou seja, por um retiro de verão de três meses. Um mês
consiste de três “períodos” de dez dias: início, meio e fim.
[95]
Muito pouco é sabido de Hui-wen e a passagem aqui no Mo-ho chih-kuan é uma das primeiras e mais confiáveis no escopo
biográfico. Mais detalhes estão disponíveis apenas em Registros dos Patriarcas Budistas ???? (Fo-tsu-t’ung-chi, T2035, 49.129-475), um trabalho biográfico
sectário sobre T’ien-t’ai do século XIII, onde a biografia de Hui-wen está
incluída num sexto fascículo, T 49.178b11-179a4.
[96]
Lit., “caminhou sozinho” ??, que implica no fato de que ele seguiu sozinho e
não praticou sob ou na companhia de outros monges. Contudo, a biografia de
Hui-ssu em Biografias de Monges
Eminentes, Parte 2 ???? (T #2060, 50.562c6-564a17) afirma que “Hui-wen
reuniu muitas centenas de seguidores” (562c28). Eu prefiro compreender tal
frase como significando que Hui-wen era “inalcançável” ou “insuperável” em seu
tempo.
[97]
Isso pode ser uma referência adicional à citação de Hsün-tzu acima, veja nota 15: “Se o cavalheiro estuda largamente e
a cada dia se examina, sua sabedoria se tornará límpida e sua conduta sem
falhas. Se você não escalar a alta montanha, você não compreenderá a altura dos
céus; se você não olhar abaixo no vale profundo, você desconhecerá a profundeza
da terra.” Stevenson, Mo-ho chih-kuan
(nota 53, p. 107), atribui a ideia a “vinda de Tso-chuan, décimo quinto ano do Duque Hsi; veja também Shuo yüan, 18:24.” Parece ser um tipo de
ideia bem comum nos clássicos.
[98]
Veja o Tratado sobre a Contemplação dos
Pensamentos ???, T #1920, 46.584, um breve documento sobre os ensinamentos
finais de Chih-i antes que viesse a falecer. A referência a Nagarjuna está em
585c20. O texto original, na verdade diz “prestar obediência a” Nagarjuna, mas
a intenção é a mesma.
[99]
Ou seja, o método dialético do Tratado do
Meio é destrutivo e negativo – seu intento é destruir as visões falsas e
negar a validade de qualquer construção verbal e conceitual; o intento da
cessação-e-contemplação é construtivo e positivo – estabelecer a calma cessação
e contemplação perceptiva.
[100]
O Tratado do Meio traduzido por
Kumarajiva e usado mais extensivamente na China (T #1564) inclui um comentário
em versos por um certo “Olhos Azuis” (*Pingala ou *Vimalaksa). Veja a discussão em Robinson, Early Mahayana, pp. 28-30; veja também
Richar Gard, “On the authenticity of the Chung-lun,”
Indogaku bukkyogaku kenkyu 3/1
(1954): 370-376, e Brian Bocking, Nagarjuna
in China: A Translation of the Middle Treatise (Lewiston: The Edwin Mellen
Press, 1995) [daqui em diante “Bocking, Middle
Treatise”] para detalhes sobre a controvérsia ao redor desse texto e seu
autor. Bocking (pp. 402-405) afirma convencido que “Ch’ing-mu” se refere
a Vimalaksa, o mestre de Kumarajiva e que tal parte do comentário no Tratado do Meio deveria ser atribuído a
Kumarajiva.
[101]
Tratado do Meio capítulo 24, verso
18; T 30.31b11-12. Tal verso é a maior inspiração direta para o conceito de
Chih-i da verdade tríplice (e contemplação tríplice), que provê uma estrutura
dinâmica para a filosofia e prática T’ien-t’ai. Veja Swanson, Foundations, especialmente pp. 1-17,
sobre a significância desse verso. Chih-i evoca esse verso para mostrar que o
ensino de Nagarjuna não era totalmente ou necessariamente negativista. “Vazio”
pode soar negativo, mas uma correta compreensão do pratitya-samutpada, com seus aspectos de existência convencional e
o Caminho do Meio, tem um enfoque positivo que é consoante com o processo
construtivo, positivo e “ampliador” da cessação-e-contemplação.
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